31 de março de 2011

Censurado

Dilacerado o sentido
cru da existência,
ornada a chamada
vida pelo pretenso
- e no entanto fátuo –
cintilar das pétalas de
orquídeas miseráveis
– pelo vislumbre
de uma paisagem cujos
contornos se dissolvem
ao tato.

Não é espantoso
perceber que o canto
fatigado se dissipa
entre as muitas vozes
que o entoam
- e que o calam:
o alarido permanece.
E em seu ruído,
o desespero, pronunciado
em alegorias e em falsas verdades.

O alarido permanece.
E em seu ruído,
a ruína de toda uma nação.

21 de setembro de 2010

Adolescência

A Rômulo Pacheco, o amigo mais fuleiro
Tudo começou com
um chapéu de palha.
Se ninguém lembra
é porque quase ninguém viu.
Fizeram pouco caso, na verdade,
mas cá estou a desvelar história.

Este blogue começou dum
toque de chapéu de palha
na nova cidade e seus
desengonçados modos de quem quer ser grande.

A moleira devidamente protegida foi um convite à reflexão.

A cidade dos poetas
de românticos cantos
a azulejos e bumba-boi,
mais adolesce ou adoece?

Engolidos por modismos fugazes
Esquecidos
pela cidade desengonçada com modos de quem quer ser grande
que somos

Nós

adolescemos
e roubamos de presente uma alcunha
quase que despretensiosa.
Na cidade adolescente
com um toque de chapéu de palha,
viramos Salvadores Daqui.

15 de setembro de 2010

translucido a verdade
o corpo debalde
matéria ração
razão

24 de agosto de 2010

Verão

Chuva torrencial
num dia só pro mês inteiro
As goteiras escorrem cachoeiras
os telhados ameaçam ruir.

Não há salvadores com espadas desempainhadas prontos para o combate.
há um moleque que banha na chuva
um moleque maranhense que banha na chuva.

Ê, chuva torrencial
preces a São Pedro
e todo ano se repete a mesma coisa.

- Num dia só pro mês inteiro!

23 de agosto de 2010

mosca na sopa

um grande soluço tem sua aproximação iminente
numa torrente de abstrações indefiníveis e portanto
inimagináveis para os homens de meu tempo. seguido
por um golfo negro vermelho e amarelo de sujeira sangue
e pus onde se deita cansada a cara do mundo respirando
o desejo ancestral de explodir-se num grande e interminável
gozo.

meu número é 016482572001-5 e eu sou mais um entre tantos
rostos anônimos cujo único aspecto que conhecemos é o teor
cadavérico de suas sentenças explicativas. não desejo além do
comercial da televisão. todas as minhas expectativas se resumem
em consumir a degradação de minha espécie em singelas prestações.
obsessivos desmandos me constituíram uma classe inferior, mero
produto do estilo de vida consumista. sou só mais um entre tantos
números, tatuado com a marca da civilização e suas emoções mesquinhas.
apenas um conceito de cidadania passiva que se abriga numa caixa,
entediado com sua condição de excessiva subserviência e preguiçoso
por ter engolido toda a merda que cuspiram em cima de mim. sou só
mais um para não ser ninguém, ser enganado e morrer de raiva deitado
no sofá da sala com a tv ligada.