um grande soluço tem sua aproximação iminente
numa torrente de abstrações indefiníveis e portanto
inimagináveis para os homens de meu tempo. seguido
por um golfo negro vermelho e amarelo de sujeira sangue
e pus onde se deita cansada a cara do mundo respirando
o desejo ancestral de explodir-se num grande e interminável
gozo.
meu número é 016482572001-5 e eu sou mais um entre tantos
rostos anônimos cujo único aspecto que conhecemos é o teor
cadavérico de suas sentenças explicativas. não desejo além do
comercial da televisão. todas as minhas expectativas se resumem
em consumir a degradação de minha espécie em singelas prestações.
obsessivos desmandos me constituíram uma classe inferior, mero
produto do estilo de vida consumista. sou só mais um entre tantos
números, tatuado com a marca da civilização e suas emoções mesquinhas.
apenas um conceito de cidadania passiva que se abriga numa caixa,
entediado com sua condição de excessiva subserviência e preguiçoso
por ter engolido toda a merda que cuspiram em cima de mim. sou só
mais um para não ser ninguém, ser enganado e morrer de raiva deitado
no sofá da sala com a tv ligada.